“ Cristo ressuscitou! Aleluia!”
Era um dia cheio de alegria e de esperança, com raios de sol a entrar pelas estreitas janelas da Igreja a juntarem-se às luzes das velas acesas em todos os altares onde vasos de flores e toalhas brancas davam aos Santos um ar mais divino e feliz.
Na capela – mor as Bandeiras (estandartes), o Pálio ( sobrecéu portátil que se leva nas procissões para cobrir o sacerdote que leva a Custódia) e as lanternas, encostadas à parede, e o Guião (estandarte que vai à frente nas procissões) junto ao guarda-vento, assinalavam a particularidade deste Domingo.
O povo que ali se encontrava reunido, com roupa “de ver a Deus” porque para se andar de qualquer maneira já bastavam os outros dias, entoava cânticos de Aleluia, numa comoção sentida de vitória. Na altura da Comunhão muitas pessoas comungavam, incluindo homens tendo, para o efeito, havido Confissões para a preparação. Fazia parte dos deveres de bom cristão confessar-se pelo menos uma vez no ano, de preferência pela Páscoa. Terminada a missa, seguia-se a procissão pelas ruas principais da aldeia que, no dia anterior, tinham sido varridas, com vassouras feitas de giestas, pelos moradores. Era linda a procissão! O Guião, grande e pesado, requeria braços fortes, de homem, para o manejar sobretudo na descida do Outeiro, assim como as lanternas. As outras Bandeiras, mais leves, até as raparigas, algumas vezes, as podiam transportar. Das janelas e varandas pendiam colchas de tecido adamascado ou feitas à mão que, mesmo que fossem sempre as mesmas, eram sempre notadas.
O sino tocava com mais força ao recolher da procissão e, ao entrar na Igreja, as palavras “Aleluia”! “Aleluia”! continuavam a fazer-se ouvir para poderem ficar bem gravadas na nossa memória e ainda hoje fazerem eco nas nossas cabeças com cabelos brancos…
Também a alimentação, neste dia, era melhorada. No Sábado, o Forno Grande ( comunitário) não tinha descanso para cozer os biscoitos numas fornadas a seguir às outras. Num alguidar de barro misturava-se a farinha, os ovos, o açúcar, mexia-se com uma colher de pau e obtinha-se uma massa consistente que se deitava em forminhas de lata untadas com azeite ou se dispunha aos montinhos em tabuleiros. Era uma azáfama: na casa do Forno entravam cestas com os ingredientes e saíam cheias de biscoitos embrulhados em pequenas toalhas… para nós era uma alegria! Se nos deixassem, comíamos a massa às colheradas em vez de só raparmos o alguidar e lambermos a colher!
O jantar ( refeição por volta do meio-dia) do Dia de Páscoa, em regra, era constituído por carne de borrego que, ou se tinha dos rebanhos ou se comprava. Preparada de véspera, era guisada numa caçarola de barro preto de Molelos, sobre a trempe, com lume moderado. Azeite, alho e vinho branco e bastante tempo para apurar bem, eram o segredo do cozinhado. Depois, bastava cozer batatas que, a molhar naquele molho, (como se dizia), era de comer e chorar por mais! O arroz -doce comia-se à sobremesa e, em algumas casas, encetava-se um queijo.
As amêndoas também faziam parte da tradição e constituíam, para nós, uma guloseima. Quase só nesta Quadra nos lembrávamos delas, oferecidas por padrinhos ou familiares, faziam as nossas delícias e não descansávamos enquanto não dávamos conta delas porque, afinal, amêndoas era coisa de criança e duravam tão pouco tempo na boca…
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