terça-feira, 8 de junho de 2010

O Barbeiro - Anos 50/60- Vila Boa do Mondego

A barbearia que mais propriamente correspondia aos parâmetros da época, situava-se no largo do Soalheiro. Era um espaço pequeno onde a cadeira de barbeiro rotativa sobressaía entre os bancos corridos encostados às duas paredes laterais. Frente à porta, um espelho grande reflectia os rostos masculinos marcando a nítida diferença do antes e do depois. Na verdade, a grande maioria dos homens, preocupados com o trabalho da lavoura despreocupavam-se com o crescer da barba durante a semana e, só ao Sábado depois do sol posto, entravam na barbearia. O que valia era a espuma espessa de sabão, abundantemente espalhada na cara, com um pincel, e a navalha permanentemente afiada, para desfazer a barba de oito dias que, em movimentos regulares, era depositada no limpa – navalhas que, de vez em quando, era descarregado em folhas de jornais. Por vezes, a perícia do barbeiro não conseguia evitar pequenos cortes que, desinfectados com álcool, mal se notavam no dia seguinte. A pequena sala enchia-se. O trabalho ia-se acumulando sempre que um ou outro freguês também cortava o cabelo. A espera também fazia parte e as conversas constituíam uma fonte de informação das ocorrências locais e arredores, não sendo relevante a falta de actualização. O barbeiro parecia que sabia tudo: sabia ouvir e comunicar, corrigir a informação e deixar os outros falar. O seu desempenho e presença, tornavam-se, por isso, imprescindíveis. Durante a semana, em dias certos, deslocava-se às Quintas dos lavradores para exercer as suas funções levando na caixa de madeira os apetrechos necessários.


Possivelmente, também as pontas dos nossos cabelos caíram no chão desta barbearia, pois era preciso cortá-las amiúde para ficarem mais fortes. Mais fortes foram também as aspirações do barbeiro que fechou a porta e partiu para o Brasil.

Outra barbearia abriu, numa sala improvisada por baixo do Salão, no Santo António, onde pai e filho exerceram a mesma profissão. O pai, mais vocacionado para as lides agrícolas, sendo reconhecido como enxertador experiente, de pouco tempo dispunha. O filho, apostando noutras capacidades latentes, cedo reconheceu que os cortes das barbas e dos cabelos, se bem que rejuvenescessem fisionomias, não eram suficientes para governar a vida e emigrou para França. Com ele se passou este episódio curioso que, ao tempo, ouvimos contar:

Entrando, certo dia, na Taberna segurando na mão a maleta de barbeiro, após ter visitado um freguês numa Quinta, alguém de modo zombeteiro lhe perguntara:
- A como vendes a grama? ( Insinuando a comparação com os ourives ambulantes).
- Prontamente, o jovem barbeiro lhe respondeu:
- A quanto você gramar!

Provavelmente, este nosso amigo já não se recorda desta ocorrência e muito menos da pessoa que o interpelou. Com receio de ferir susceptibilidades evitamos referir nomes, conscientes do valor acrescido que estas memórias poderiam ter. Porque os nomes das pessoas dão vida às narrações, atestam a veracidade dos factos e estabelecem maior cumplicidade no viver que partilhámos.

Sem comentários: